quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Vencer batalhas

Quando sofri o AVC, aprisionei toda a réstia de esperança que possuía, reuni todas as forças que foram possíveis de conseguir, foram dias difíceis, de muita luta, vencer as primeiras batalhas com que fui confrontada, foram as mais complicadas da minha vida, tinha consciência que era uma luta que só estava a começar.

Em várias ocasiões, senti a sensação de carregar a metade de um corpo adormecido, outrora cheio de vida, senti uma alma que tinha sido violentada, tamanho tinha sido o choque que padeceu.

Sentia que o meu cérebro e o meu corpo falavam línguas diferentes, o meu lado direito encontrava-se em contínua aprendizagem, tinha que assimilar tudo de novo, polir grandes arestas, eram lapidações que não se extinguiam.


Constantemente, fiz o que era necessário para recuperar o mais possível, que tantas vezes pareceu ser quase impossível reverter esta situação, com o tempo comecei a avistar tudo mais claro na minha cabeça, o que  acreditava ser possível, começava a ser uma realidade mais presente.

Ao invés de desperdiçar energia, tratei de utilizá-la, em prol de mim mesma, as coisas sempre iriam melhorar de um jeito ou doutro, alguns dias são mais difíceis que outros, é uma realidade, mas a certeza que tudo é possível, está cada vez mais presente no meu peito!


Anabela Jerónimo Resende

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Chegou o dia...

Chegou o dia, em que não existia mais nada de importante, para continuar apegada ao passado, nada mais  fazia sentido em continuar ligada a essa vida, que nada de novo acarreta, de bom só vão restando as memórias, então chegou hora de seguir em frente, não é tarefa simples de fazer, mas necessário para projectar outra existência e para trazer a paz interior.

Chegou o dia, em que olhei ao redor, e já não consegui possuir um vínculo com aquilo que tanto era desejado, que tudo já faz parte de um passado longínquo, que não regressa mais, que o tempo passou e existe um futuro que aguarda.

Chegou a hora de partir em busca de novas aventuras, de arriscar novos caminhos, de atravessar novas pontes, de um novo futuro que segura novos sonhos em busca de um renovado ego, de um desapego a um passado onde vivia presa, por recear a mudança ou por pensar que sem o passado, deixava de existir.

Já chegou o tempo de deixar partir o que não me causa mais felicidade e abrir os braços para que o futuro chegue e ocupe o seu lugar e traga novas lembranças, porque o desassossego já pairou o seu tempo, por isso é tempo de deixar de estar presa a um momento, é essencial deixar entrar a luminosidade e ocultar a obscuridade que ameaçava os dias de outrora, porque os dias de desapontamento e de agitação, já abrangeram o seu momento, por uma causa que coabita em mim!

Anabela Jerónimo Resende


quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Vontade de sair a correr

Foi muitas as vezes, a vontade que senti de sair a correr, de correr até não puder mais, de caminhar até o mais longe que pudesse, até sentir as minhas pernas cansadas, até que o meu corpo não aguentasse mais.

Senti-me presa, mesmo sem ter amarras, como se fossem invisíveis aos olhos, como se tivesse uma aparente liberdade, mas presa dentro de mim, como se fosse livre e não pudesse sair do mesmo sítio, senti-me como um pássaro numa gaiola, proibida de poder voar, queria tanto ter a sensação de estar livre e não depender de ninguém.

Ainda sinto vontade de sair a correr, mas de uma maneira diferente, com uma vontade de caminhar ligeira e solta, sinto-me mais livre, a restaurar as minhas asas partidas, que lentamente recuperam as forças, mas mesmo assim sinto falta das minhas caminhadas de antigamente.

Neste momento é do que sinto mais privação, do que tenho mais saudades, do que desejo mais recuperar, e como desejo voltar a caminhar como antigamente, nada mais interessa no emaranhado de factos que um dia perdi e que muitas saudades outrora possuí.

Anabela Jerónimo Resende


sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Memórias recentes

Carreguei durante algum tempo, a sensação da minha mente sentir-se vazia, mas ao mesmo tempo possuir um corrupio de memórias e sentimentos, a deambularem no meu pensamento evacuado de tudo, muitas perguntas fiz no silêncio do meu interior. 

Enquanto encontrava-me inteiramente reclusa do meu próprio corpo, conciliar o sono parecia uma tarefa quase impossível, a imagem que demonstrava era que estava sempre sonolenta, no entanto, interiormente os meus sentidos encontravam-se alerta.

Debilitada de corpo e ferida na alma, foi num esforço desmedido que consegui manter-me à superfície, quando sentia ser subjugada para o fundo dum abismo, pois possuía as forças consumidas para contrariar a derrocada, lentamente, nem sei bem de onde compareceram, recomecei a possuir mais energia, deixei de estar tão submissa ao meu lado mais enfraquecido, sentia que alcançava as forças para voltar à vida.

Foi num retorno lento, de passos muito vagarosos, mas muito aguardado por mim, como se estivesse aprisionada no fundo do mar, e a precisar de ar puro a encher os pulmões inflamados, de tão ressequida estar por dentro, que consegui submergir à superfície e começar a encontrar-me de novo.

São lembranças que guardo dentro do meu peito, são lembranças de uma época muito difícil, ainda deveras presente na minha memória, para que eu relembre que tempos muito maus tiveram o seu tempo, para que depois melhores tempos chegassem até mim!

Anabela Jerónimo Resende

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Discrepâncias

O ginásio de fisioterapia estava tão frio quando cheguei, parecia que não estava ninguém lá, que estava abandonado, tanto era o frio que sentia impregnado nas paredes da clinica, no entanto sentia-se a vida a pulsar lá dentro, discreta, mas de uma vida intensa em prol de outrem, de um calor humano imprescindível num local como aquele.

São tantas as ocasiões em que sinto-me assim ou serão vezes demais, grita o meu lado físico, de estar presa a uma câmara refrigeradora, que coabita comigo neste meu corpo, que não consegue regular a temperatura temporariamente ou serei eu que quero acreditar nisso, ao não dar total consideração ao outro lado pertinente e de relevo na minha vida, que vive oculto dentro de mim.

Sem querer dar a importância que o contratempo tem na realidade, faço uma sessão muito lucrativa para a minha reabilitação ao nível corporal, e tento esquecer segmentos internos que fogem ao meu controlo, ao evidenciar a minha atenção no problema, que considero maior, que é a minha condição física.

Anabela Jerónimo Resende

Caminhos revividos

Da varanda de um quarto, outrora muitas vezes visitado, examino e avisto o caminho quase sem fim, que caminhei vezes sem conta, umas vezes por gosto, outras vezes só por necessidade de caminhar, e os caminhos continuadamente quase iguais, quase inalteráveis.

Mesmo com passos lentos, caminho por colinas e vales que outrora trilhei apressadamente, tudo ao meu redor faz-me lembrar de tempos em que não tinha entraves, em que tudo era plano, ou era eu com a minha ligeireza que não dava conta, da existência das ruas rasgadas e da calçada disforme.

Ao pensar nos caminhos que trilhei, ao pensar nas saudades que tenho desse tempo, lembro-me da forma física que ao caminhar consegui atingir, por vezes era difícil de superar o meu passo apressado.

Como posso pensar esquecer, se as memórias que vivi estão tão presentes em cada canto que passo, em cada esquina que me encontro?
Como posso eu esquecer de tão boas recordações, que estão infiltradas em mim, no meu ser, que fizeram de mim o que sou hoje?

Não quero esquecer… Quero recordar e resplandecer de alegria.

Quero expressar que um dia caminhei por esses caminhos velozmente, quero verbalizar que caminhei por lugares que me concederam boas recordações e que hoje em dia caminho lentamente, por infortúnio da vida, não por minha vontade, por decisão do destino.

Mas as recordações caminham a par e passo comigo, não para me entristecer ou para que eu fique agarrada ao passado, mas para me recordar de quem eu fui e de quem posso, um dia qualquer, voltar a ser.

Anabela Jerónimo Resende

domingo, 13 de novembro de 2016

Sobrevivente

Sobrevivente porquê?

Porque um dia fui violentamente atacada, aos 44 anos, estando a seguir a minha vida, num momento em que tudo sucedia bem, no dia 12 de Janeiro de 2013, por um Acidente Vascular Cerebral, (AVC), deixando-me paralisada do lado direito, e arremessada numa cadeiras de rodas.

Tinha tudo, para ser consumida pelo AVC, tal foi a violência com que fui atingida, mas não quis que a minha vida fosse pautada por tão terrível acontecimento, pois eu era mais forte e desejava, como ainda desejo hoje em dia, recuperar parte da minha vida de volta, dentro do possível, e das adaptações que preciso fazer, nada será igual ao que era, tanto pelas mudanças que operaram em mim, como o facto de eu ter mudado e encarar a vida de outra maneira.

A minha vida mudou, mas não encaro essa mudança como um castigo ou algo que deveria condicionar-me, tento sempre testar os meus limites e querer ir o mais longe possível, pois só eu poderei restringir a minha vida! 


Quase todas as pessoas têm uma história de sobreviver a algum desaire ou a uma fúria de acontecimentos infelizes que a vida teima em causar.


Anabela Jerónimo Resende