sábado, 28 de setembro de 2019

A minha fala


Como tinha um pouco de conhecimento, devido ao trabalho que exercia, sabia que o lado esquerdo do cérebro é o que comanda a fala, logo também sabia que corria um sério risco de perdê-la.

Apesar de ter momentos que dormia e muitos momentos de ter a sensação de estar fora do meu corpo, sempre que conseguia a ligação com a minha consciência, a minha principal preocupação era a minha fala.

Então silenciosa, numa sala onde o silêncio não se fazia ouvir, devido às várias máquinas ligadas e aos queixumes de quem se sentia desesperado, pedia a Deus para não ficar sem fala, que iria suportar tudo, mas para não me deixar sem falar, que isso não iria suportar, que com as sequelas físicas iria arranjar maneira de conseguir lidar, mas sem a fala não.

De início tinha a percepção que não me fazia ouvir, que falava, mas a voz não chegava aos outros e perguntava continuadamente se estavam a perceber o que eu dizia, mas nunca perdi a minha voz.

Saí do internamento ainda com a voz meio sumida, diferente, mas estava lá, soube mais tarde que fiquei com a síndroma do sotaque estrangeiro, falava tudo com um sotaque de alguma língua estrangeira, e com disartria, dificuldade de articular algumas palavras, que ainda se mantém.

Fiz terapia da fala em Setúbal, no Hospital São Bernardo, em ambulatório e nas Residências Montepio, uma Unidade de Cuidados Continuados, onde estive internada, para melhorar a fala, apesar de os deficits não serem grandes.

Deus ouviu o meu pedido e não me desamparou, então como posso revoltar-me com quem poupou a minha fala, o que eu mais queria?

Só tenho é que agradecer e muito.
E tenho conseguido ter todos os dias, força e determinação para suportar o grande fardo a que fui submetida!

Anabela Jerónimo Resende

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Parabéns Portugal AVC


Hoje, 23 de Setembro, faz 3 anos que a PT. AVC - União de Sobreviventes, Familiares e Amigos se tornou num projecto real.

Com um núcleo de pessoas decididas a abraçar este nobre projecto, sejam sobreviventes, familiares e profissionais de saúde ou simplesmente pessoas que querem ajudar.

Empenho, entrega e  espírito de voluntariedade são particularidades de quem se dedica à Portugal AVC.

Sempre em benefício dos sobreviventes de AVC para ajudar a minimizar as dificuldades que encontram na sua reabilitação, na sua integração profissional e social.

E sempre que possível contribuir para ajudar na prevenção, alertando a população sobre os factores de risco de um AVC.

Fazer parte desta família crescente que é a Portugal AVC, é motivo de orgulho e dedico-me de coração a esta nobre causa.

Um agradecimento a todos que tornaram possível a existência da Portugal AVC!

Anabela Jerónimo Resende

















sábado, 21 de setembro de 2019

Tempo

   Antes & Após AVC

Num passado próximo, desejei muitas vezes poder viajar no tempo, de voltar aquele tempo, em que não dava valor ao que verdadeiramente era valioso, a minha vida.

Ao sentir-me perdida no tempo várias ocasiões, precisei de tempo para pensar no que era importante para iniciar uma viagem no tempo futuro que me conduziria a um caminho mais promissor.

O tempo foi conselheiro para eu compreender que precisava de tempo para me fortalecer, para voltar a ser eu de novo e que o tempo não volta atrás.

A realidade é que mudei com o tempo, mas peço ao tempo, tempo para que me dê forças sempre para continuar a lutar por uma vida melhor e mais sábia.

E sinto agora já não precisar de voltar no tempo para me encontrar, eu estou aqui mais segura que nunca e tenho aprendido com o tempo, que não preciso de tempo para voltar ao passado, preciso é de tempo para viver o futuro plenamente, limitada, mas seguramente viva e com tudo o que preciso.

E como o tempo não espera por mim, é tempo de viver intensamente e tempo de fazer o que me faz feliz!

Anabela Jerónimo Resende

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Persistência


Já passaram muitos anos de luta, de superação desde que sofri o AVC, muito aconteceu desde então, foram anos, meses, dias muito complicados, foi uma fase muito difícil de ultrapassar, sem saber ao certo o que o futuro me reservava, mas o tempo trouxe-me respostas que não consegui obter rapidamente.

Tive uma recuperação até agora como ninguém pensou que conseguisse, consegui vencer muitas batalhas que de início pareciam impossíveis, foi preciso ultrapassar a tristeza, ultrapassar a mágoa, ultrapassar grandes lutas interiores, e os meus receios foram se transformando em experiências positivas e assim consegui erguer-me e cheguei a superar muitos dos meus limites.

Depois de fazer muitas terapias, como terapia da fala, terapia ocupacional, passando pela reabilitação do vestibular, experimentando acupunctura, fazendo pilatos e nunca esquecendo a fisioterapia, que ainda faço passado tanto tempo.

Apesar de o meu corpo ainda não responder como deveria, não vivo iludida que possa acontecer uma recuperação total, prefiro acreditar e agradecer o que já consegui conquistar.

O tempo vai passando e as sequelas vão perdurando, mas eu vivo empenhada em persistir e nunca desistir.


Anabela Jerónimo Resende

domingo, 8 de setembro de 2019

Dia Mundial da Fisioterapia


O meu sentimento é e será sempre de gratidão para os profissionais de fisioterapia, que de alguma maneira me ajudaram a seguir em frente nestes anos depois do AVC que sofri no dia 12 de Janeiro de 2013.

Além da minha determinação, da minha grande vontade de desejar de ter uma boa recuperação e no sentido de a minha autonomia ser cada vez mais e melhor, são os fisioterapeutas que me auxiliam para ter aquele suporte que preciso.

A todos os fisioterapeutas que têm cruzado o meu caminho, que têm tornado o impossível, mais perto do possível, sou grata e jamais esquecerei pelo que têm feito por mim.

Ainda não estou fisicamente como gostaria, mas sei que cada vez estou melhor, pelo apoio, pela força e pela orientação que colocam há minha disposição, nesta caminhada que ainda não tem um fim há vista.

A minha enorme Gratidão!

Anabela Jerónimo Resende

quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Para sempre é muito tempo…



Ainda estava hospitalizada e já tinha o destino traçado pelos médicos que me assistiram, que nunca iria andar, por isso teria que ser dependente de uma cadeira de rodas para sempre.

Só soube do diagnóstico, passados 2 meses de sofrer o AVC, depois de vir da minha primeira consulta de neurologia, quando fiz questão de ler todos os relatórios médicos, apesar de terem relutância de me mostrarem por serem muito negativos em relação há minha recuperação.

Passados tantos anos ainda me lembro tão bem do que disse depois de acabar de ler os relatórios, virei-me para o meu marido e disse que não podiam estar a falar sobre mim de certeza, que eu nunca iria ficar numa cadeira de rodas para sempre e que não me conheciam para afirmarem sem espaço para dúvidas, que era isso que iria acontecer.

Teimosamente, nesse dia e como em muito outros dias no futuro, não quis ir à consulta de neurologia de cadeira de rodas, então lá fui ainda sem nenhuma ortose no meu pé direito e com o apoio de um tripé para a consulta, para espanto do neurologista.

A minha marcha na altura era péssima, andava meio encurvada, com uma postura horrível, o meu pé não se mantinha direito, mas fui mesmo assim e a minha teimosia nunca me deixou desistir e quanto mais eu ouvia dizer que não iria ser capaz, mais eu me esforçava para conseguir.

Muitas vezes as dúvidas não eram ditas em palavras, eram ditas com olhares, eram ditas com atitudes, no entanto a minha determinação perante isso era a mesma, pois desde o início que sempre disse que não iria ficar dependente de tudo e todos e ainda percorro um longo caminho, cheio de barreiras, de dificuldades e repletos de complicações, para que isso não aconteça.

Evidentemente tenho conseguido algumas vitórias que me deixam orgulhosa do esforço que tenho feito e nada nem ninguém vai conseguir mudar a minha maneira de encarar as dificuldades e as minhas motivações.

E para sempre é muito tempo quando a minha determinação é enorme e não fico dependente de outros para alcançar o meu propósito de conseguir superar as barreiras que tenho de vencer.

Anabela Jerónimo Resende

domingo, 1 de setembro de 2019

#1 Carta para o meu neto



Dia 31 de Agosto foi um dia especial para mim, foi o dia em que o meu neto fez 1 ano e eu escrevi-lhe uma carta para saber o quanto é especial para mim.

#1 Carta para o meu neto

Hoje é o teu dia. O teu. 
O dia em que nasceste e eu me tornei avó.

Passou um ano, um ano inteiro e parece que foi ontem, porque as memórias daquele dia em que nasceste ainda estão tão presentes.

Como me lembro bem da primeira vez que te vi, que te peguei ao colo, não sabia se havia de rir ou chorar, tamanha era a felicidade que sentia invadir o meu coração, vai ser um dia que vou sempre recordar.

Ver a tua carinha, de quem acabou de chegar a este mundo, foi inestimável, é uma memória que ficará sempre gravada em mim.

Ser tua avó e observar-te a crescer tem sido uma dádiva e uma aventura, és uma criança sempre tão alegre, tão amorosa, tão traquinas, tão cheia de vida.

Se me mostrassem uma sala cheia de meninos para escolher um de quem queria ser avó, iria sempre escolher-te a ti, porque és tudo o que sonhei para o meu neto e muito mais.

Se um dia alguém dizer que eu te mimo demais e que te faço as vontades todas…
Sabes o que vou fazer?

Vou fingir que não ouvi, nem quero saber, pois só me interessa ser tua avó, mimar-te e contribuir para que sejas um menino sempre feliz.

Porque fazes de mim a avó mais afortunada do mundo e a mais feliz também.

Anabela Jerónimo Resende